Na Secção do Montijo, Comarca de Lisboa, há um Processo que se arrasta há quase dois anos.

Trata-se de uma aparente “simples” entrada numa residência ocorrida em Maio e Junho de 2015. A queixa foi prontamente apresentada. Na altura a PSP não se deslocou ao local para recolher provas na altura dos factos.

A 23 de Junho de 2015 foi feito um aditamento à queixa, entregue posteriormente ao Ministério Público, onde o queixoso fez, e muito bem, alusão a um IP suspeito que tinha acedido à sua conta Gmail através dos dispositivos furtados, nos dias 17 e 20 de Maio de 2015.

Entre 13 Agosto de 2015 e 7 de Julho de 2016 nada foi feito no inquérito para o acelerar. O inquérito ficou quase um ano sem qualquer movimentação de relevo ou novos dados para a investigação. Recorde-se que os processos, de acordo com a lei, devem terminar a sua fase de investigação idealmente num prazo de oito meses. Mas este processo ficou parado onze meses.

Procurador não investigou atempadamente

Munido de um IP e uma data de acesso, era dever do Procurador da República solicitar nos termos da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, o nome e morada do IP que usou o serviço, para que pudesse identificar o assaltante ou a quem o equipamento terá sido vendido.
Acontece que, nos termos do Art.º 6.º da referida lei, os prestadores de serviços de internet “devem conservar os dados previstos no mesmo artigo pelo período de um ano a contar da data da conclusão da comunicação”.
Mas, com o atraso no processo a conservação de dados já entretanto se perdeu, impedindo a identificação da única pista no processo.

Procurador “apanhou a dica” da PSP

A 27 de Setembro de 2016 (ou seja, quase um ano e meio depois), quando a testemunha foi inquirida, foi no mesmo dia efectuado um relatório pela PSP que criticava indirectamente a investigação, que “[a] Unidade de Polícia Técnica (UPT), desta Polícia não se deslocou ao local, para efectuar a recolha de possíveis vestígios deixados no local (…) em virtude de os mesmos, não terem sido accionados na altura em que esta Polícia teve conhecimento do ilícito”.
Foram precisos mais três meses para, em Janeiro deste ano, o procurador ter “apanhado a dica” da PSP, que referia novamente o IP, e ter mandatado que “são também, em abstrato, susceptíveis de integrar a prática de crime(s) informático(s)” e “delego na Polícia Judiciaria a competência para proceder a todas as diligências de investigação (…) concedendo-se para tanto um prazo de 90 dias, eventualmente prorrogável”.

Este prazo, passados quase dois anos, vai inibir a PJ de obter os dados do assinante. Essencialmente, de obter pistas para apanhar os ladrões.

Ao cidadão não se pode apontar nada, a não ser a sua correta diligência. Mas ao sistema judiciário, já muito se pode apontar.

 

A Justiça em Portugal

O advogado Jaime Roriz, comentou o caso ao Tugaleaks, em abstracto, dizendo que “efectivamente no que diz respeito à justiça temos um país a dois tempos. Ou seja, o nível de perícia que um procurador de um tribunal pequenino como o Montijo pode ter ou o do grande centro são completamente diferentes. Se calhar valia a pena pensar em questões como crimes que podem ser investigados a nível nacional e não a nível local”.

Indicou ainda “que cada vez mais do lado da investigação têm que haver não só bons juristas mas bons técnico da matéria que se está a investigar”.

O Tugaleaks contactou o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) mas para um eventual comentário ao tempo decorrido e aos actos praticados, mas não obteve qualquer resposta.

 

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Foto: arquivo Tugaleaks